quinta-feira, dezembro 11, 2008

Genialidades neo-direitistas

Hoje parece ter ficado definitivamente arrumada a velha discussão sobre a esquerda e a direita: Pedro Lomba escreveu sobre isso.
Ficou assente que "as convicções políticas de quase todos nós dependem de sermos bem ou mal pagos". A explicação para a dicotomia era afinal bem simples: quem é mal pago é da esquerda e quem é bem pago é da direita.
Mal me atrevendo a beliscar tão geniais locubrações, encontro-lhes desde logo uma notória falta de originalidade: embora envolta em melhores roupagens, sempre foi essa a tese defendida pela esquerda. O que não afecta a sua bondade, obviamente: ao contrário, a convergência entre o pensamento de Lomba, autosituado à direita, com a ortodoxia esquerdista só pode significar a aceitação universal do axioma.
Embora aturdido e humilhado (as grandes ideias são assim, acontecem sempre aos outros, e desta nunca me tinha surgido nem faísca), mantenho todavia algumas perplexidades. Por exemplo, se o Pedro Lomba, que é de direita, ao que tem dito, partilha essa visão com a esquerda, teremos que concluir que aquilo que os distingue é apenas o facto de ele ser bem pago e os que são de esquerda serem mal pagos? Apetece perguntar, neste ponto, a partir de quanto ($$$) é que alguém é de direita... Ou se intervêm outros factores na distinção, além dos quantitativos - por exemplo se se disser que alguém é de direita a partir do momento em que se sente bem pago já estamos a afastar-nos perigosamente da tese de Lomba, interpretada no sentido objectivista que parece ser o seu.
Mas ocorre-me também que além de Pedro Lomba o único português que se tem declarado bem pago (não me lembro de mais nenhum caso) é o Dr. Vítor Constâncio. E este disse sempre que era de esquerda. A tese de Lomba, quer se interprete com um sentido objectivo ou subjectivo, implica então que o Dr. Constâncio não tenha razão, e seja, afinal, de direita, sem saber? Ou existe algum outro critério, que não o ser bem pago, para distinguir a posição política de Lomba e de Constâncio?
Fiquei também intrigado com outros pormenores (que não podem ofuscar certamente o brilho do pensamento lombar, nem por sombras). Por exemplo, quando Lomba, compreensivelmente preocupado com o crescimento do esquerdismo em Portugal, e nomeadamente com a ameaça eleitoral do Bloco de Esquerda, avança com a solução que decorre logicamente da sua fulgurante doutrina: se querem acabar com o Bloco, aumentem os salários. Ele não diz expressamente, mas temos que depreender, a partir dos pressupostos teóricos da proposta, que se trata de aumentar os salários de todos os que se propõem votar no Bloco de Esquerda. Só para esses é que se justifica o programa, os que já são de direita é porque são bem pagos. Por acaso nunca tinha notado, nas minhas observações do universo social português, que os simpatizantes do Bloco de Esquerda pertencessem a grupos particularmente mal pagos da nossa população, mas quem sou eu para duvidar das genialidades de Lomba. Só gostava que ele concretizasse, visto que adianta essa tão generosa como revolucionária proposta política, esse verdadeiro ovo de Colombo, de quanto deveria ser o aumento para todos os potenciais votantes do Bloco de Esquerda, a fim de os afastar de tão nefasta tentação, e se esse aumento devia ser igual para todos ou diferenciado conforme os graus de adesão (menos para os simples votantes, um pouco mais para os simpatizantes, mais ainda para os militantes, e substancialmente mais para os dirigentes, que custam evidentemente mais ($$$) a libertar-se do esquerdismo em que estão, dado o seu grau de envolvimento na esquerdice - o que deve significar um nível ainda mais dramático de carências, como é evidente quando se olha para o ar famélico de Louçã ou de Fazenda).
Estas fantásticas teorizações lombares convergem também com a mundivisão dos redactores dos nossos jornais e telejornais, como é bem notório nos relatos das recentes turbulências na Grécia (ou noutros acontecimentos semelhantes, desde o Maio de 68 às crises universitárias um pouco por todo o lado). Tudo radica, adiantam-nos eles sem pestanejar, no acentuar do fosso entre ricos e pobres, que despoleta o mau estar e a revolta que se evidenciam nessas desordens. A um olhar realista ressalta que se há ricos e pobres nessas histórias eles em geral estão nas posições contrárias ao que seria de esperar nesse esquema. Como dizia o outro, filhos do povo são os polícias, não são os universitários. Estes tumultos parecem muito mais bravatas de filhos-família do que propriamente revoltas de desfavorecidos da sociedade. Mas quem somos nós para perturbar os esquemas mentais de quem tão poderosamente faz a chuva e o bom tempo, e dita as regras do pronto-a-pensar....
O que nos espanta, sinceramente, é que haja quem pague por isto.

1 Comments:

At 6:44 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Já tinha lido esse artigo de opinião à hora de almoço. Se alguém tinha ainda dúvidas acerca da parcialidade dos media, esse artigo tudo clarifica. Os fazedores de opinião, os moldadores de cérebros trabalham efectivamente para quem manda no país e no mundo. Infelizmente a população esclarecida é pouco numerosa, daí o sucesso das bestas.

 

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