domingo, fevereiro 19, 2006

Eu perante a "ameaça islâmica"

A verdade é que o Islão está a morrer.
Ao choque da modernidade está a esboroar-se rapidamente.
Não tardará muitos anos que ao lado da Caaba os fiéis encontrem uma tenda da McDonalds, refulgente no seu letreiro encarnado.
Bem sei que a minha convicção vai contra os alarmismos generalizados, frementes perante o “perigo islâmico”, mas a solidão nunca me impressionou excessivamente.
Uns anos mais e no recinto sagrado serão tantos os turistas de máquina de filmar em punho e de carnes delicadas ao sol como os vultos envoltos nas vestes brancas dos devotos.
As análises que vejo espalhadas sobre “o islamismo” parecem-me em geral confundir vitalidade com simples estertores e manifestações de força com meras exibições de impotência e desespero.
Há-de haver quem me observe que desde há bastante tempo o islamismo é a religião que mais cresce no mundo, graças ao seu vigoroso proselitismo.
Conheço as estatísticas: o islão avança nas margens, enquanto vai estiolando por dentro. Conquista e converte estranhos, enquanto vai perdendo o coração pelos petrodólares, o hamburguer e a Coca Cola.
É a religião que mais cresce no mundo porque avança como uma mancha em África, para Sul, e em outras zonas de fronteira, como a Ásia Central, ou mesmo entre as multidões desenraízadas da Europa e das Américas.
Nada de estranhar: em confronto com os universos animistas a espiritualidade muçulmana apresenta uma superioridade incontestável; e perante o vazio espiritual do laicismo e do ateísmo, ou os exotismos pagãos e os esoterismos mais ou menos orientalizantes em voga no mundo ocidental, representa uma resposta obviamente muito mais elevada. Sempre oferece uma metafísica menos rudimentar, e as almas precisam.
No fundo, o islão ganha terreno onde o cristianismo desertou, inibido pelas condenações instaladas dentro de casa contra o que foi sempre a sua razão para estar no mundo. E cala-te boca, para que não me acusem de estar de dedo esticado contra a Santa Madre Igreja.
Apontam-me como sinais da pujança do islamismo as impressionantes mobilizações que um pouco em todo o lado vai conseguindo. Não me convencem de nada: o que vejo nessas mobilizações é política, apenas política, sendo a religião uma bandeira, ao lado de outras.
A religião, ela, vai morrendo envenenada pelo progresso da internet, das comunicações audiovisuais, das imagens que desfilam perante os olhos sedentos das massas islamizadas.
Falam-me do admirável dinamismo dos índices de natalidade: observação verdadeira, sobretudo em comparação com as sociedades do ocidente envelhecido. Mas deixem que o hedonismo, o conforto e os métodos anticoncepcionais façam o seu caminho – e verão o que fica dessa saúde demográfica.
E a explosão dos fundamentalismos, e dos terrorismos, o que digo eu?
Muito simples: o apelo dos fundamentalismos é característico de um universo que se desmorona. É a tentação para se fechar, em defesa contra a atmosfera adversa. Mas paradoxalmente os fundamentalismos enfraquecem o todo, reavivam divisões e feridas, quebram qualquer possibilidade de fazer uso do peso que a “massa crítica” disponível parecia garantir. E os terrorismos são sintomas da queda, são fraqueza, são a reacção de quem já tentou tudo e sente que não pode fazer mais nada. São a confissão da derrota.
Evidentemente que este último fenómeno implica perigo extremo para toda a gente; quem deixou de ter medo da morte, e qualquer apreço pela vida, sua ou de outros, não conhece limites. Todavia, como é fácil de entender, isso já não é “islamismo”, nem é de religião que se trata.

3 Comments:

At 12:22 da manhã, Blogger António Viriato said...

Muito haveria a contrapor a esta sua visão demasiado desvalorizadora do perigo islâmico. Apenas aponto, no entanto, duas ou três notas discordantes : O Islão tem a força do proselitismo pelo seu lado. Acredita numa doutrina, não a discute, impõe-na aos seus e pretende impõ-la aos outros, dentro e fora das suas fronteiras, assim continuemos a encará-lo com menosprezo. Fecha-se quanto pode à modernidade, promove um obscurantismo de base religiosa. Reprime toda a dissidência interna e intimida a externa. Cria focos da sua civilização na Europa, ganha direitos de cidadania, cresce demograficamente, podendo tornar-se maioritário dentro de 1 século. Vai contestando todo o estilo de vida que colide com a sua mensagem. Sabe que enfrenta um adversário ou um inimigo - o Ocidente - demasiado materialista, nihilista, que se afunda no hedonismo consumista sem critério, que perdeu força e convicção para lutar e só o faz em última circunstãncia, cada vez com maior dificuldade, sobretudo se não perceber valores materiais em disputa. Tudo factores de grande vulnerabilidade para o Ocidente, sem embargo da sua imensa superioridade científica e tecnológica. De resto, já não seria a primeira vez na História que uma civilização superior sucumbe às mãos de outra claramente inferior, pese o embaraço actual destas designações. Será visão exagerada do problema ou aguda percepção de uma mal-estar civilizacional crescente ?
Admito, obviamente, outras visões, mas não subestimo o problema.

 
At 2:52 da manhã, Anonymous Anónimo said...

O islão está a dar as últimas?... Não me parece, mas, mesmo que esteja, não haverá o risco de nos tentar arrastar a todos na sua queda?

NC

 
At 1:09 da tarde, Blogger Olindo Iglesias said...

O Islão está em mudança, e prometo escrever mais sobre esse assunto no Portas do Cerco (www.passaleao.blogspot.com)

 

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