quinta-feira, dezembro 29, 2005

Postal para o Ashram

Dispara-me o matreiro Jansenista, de sorrisinho malicioso: “Que é feito da rapaziada que tinha o bom hábito de saborear a ficção científica de Robert Heinlein enquanto tentava digerir umas garfadas doutrinárias do Vale de Figueiredo?”
Assim, de mistura aos bons votos de Ano Novo (escrevendo sem acentos, em miseranda submissão a bárbaras tecnologias e linguagens) lança ele o isco a ver se me puxa pela língua e tira nabos da púcara. É um malandro. Mas ele é que andou lá por movimentos democráticos de libertação, que eu a mim democratices e spinolências fizeram-me sempre urticária. De modos que da rapaziada a que alude não identifico ninguém.
Confesso, porém: gosto do Zé Valle. Não sei é dele; como hei-de saber eu, que nunca vou a Viseu? O meu exílio é bem real, também não vou à capital…
Só vou sabendo o que me dizem. Olhe, de várias fontes me chegou que está em vias de a publicação de uma recolha da poesia completa do vate. Há-de ser coisa importante, solene. Deve é demorar, que quando se fala no Zé Valle o breve costuma ser alongado.
Já há uma carrada de anos eu tinha insistido com ele para tratar disso. Comecei a lembrar-me aos vinte e cinco anos de vida literária, aos trinta… Lembrei uma exposição; nunca houve nada. Agora, pode ser que ao passar dos cinquenta.
A verdade é que o panhonhas estranhamente nunca se dedicou a cultivar a glória própria, ao menos que fosse por egoísmo ou por vaidade; ao invés esbanjou décadas e energias sem fim no que o Jansenista chama doutrinação, para o que (e digo isto baixinho e só para si) não se confirma que ele tenha nascido.
Desse aspecto, está melhor. Já há anos. Creio que se pode chamar-lhe uma espécie de fascista não praticante, ou retirado. Mas tem pena; sei que lhe pica a nostalgia. Certa vez, despedindo-se de mim num passeio lisboeta, quando ao fundo se descortinava um táxi, desabafava comigo: “Eh pá, os tempos estão mesmo maus… Agora só levanto o braço para chamar os táxis…”
De resto, não sei nada. Mas imagino; nem custa imaginar. O que é que acha o Jansenista? Com a respeitável idade que o Zé Valle entretanto acumulou, junta à bonomia do fácies, o jeito afectuoso, gorducho e de cabelo impecavelmente branco, por estes dias só pode ter andado a fazer de Pai Natal, para animar os netos.

4 Comments:

At 10:18 da tarde, Blogger Jansenista said...

Sensibilizou-me a lembrança, tão apropriada para um Natal - e o José Vale de Figueiredo era e é uma pessoa eminentemente estimável e decente. Já não se poderá dizer o mesmo destes matreiros e maliciosos jansenistas, sempre com interrogações armadilhadas...

 
At 12:01 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Quem sabe do Zé Vale é o Roberto de Morais, só que ele não tem computador... mas ainda no outro dia o Miguel Freitas da Costa me falou nele, está a trabalhar, se não me engano, na Fundação Rainha D. Leonor. Será? Tenho que confirmar com o Vítor(zinho) Luís.

 
At 8:44 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Na Fundação Rainha D. Leonor?
Pois é precisamente com o Larcher Nunes!

 
At 11:11 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Ora, ora... :-)

 

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