terça-feira, agosto 23, 2005

O imperativo da reorganização administrativa

Sobre uma questão essencial a enfrentar no nosso país (a reforma da administração local, incluindo a necessária reestruturação do mapa administrativo) publicou José Alberto Xerez um excelente artigo no "Diário de Notícias". Que não passe sem a devida atenção.

Eficiência autárquica
O Estado possui, em Portugal, uma estrutura dirigista e centralizada, mal preparada para servir os cidadãos.
A inversão desta situação passa por aplicar à organização do Estado o princípio da subsidiaridade. Neste domínio a regra de ouro deverá ser a de que tudo o que puder ser eficazmente resolvido a um nível inferior não necessita de ser decidido a um nível superior.
Esta regra de ouro aponta para o reforço da capacidade de intervenção das autarquias, com vista a possibilitar um maior grau de aproximação da administração local aos cidadãos.
Estudos efectuados nos Estados Unidos da América consideram que uma gestão autárquica eficiente exige circunscrições municipais com populações reduzidas, situadas entre os 30000 e os 50000 habitantes.
Os especialistas nesta matéria consideram, pois, que o grau de eficiência da gestão autárquica se vai diluindo à medida que a dimensão populacional das autarquias vai aumentando. Grandes cidades americanas têm vindo a ser organizadas de acordo com este princípio, convindo referir a este propósito o caso de São Francisco, cuja área metropolitana abrange uma série de municípios de reduzida dimensão. Santiago do Chile está também subdividida numa série de munícipios, sendo de igual modo um caso paradigmático a considerar neste domínio.
Em Portugal, muitas das autarquias têm uma população superior aos níveis citados, em particular as que se situam nas grandes áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.
Convirá referir os casos específicos das câmaras de Lisboa e do Porto, que pelo seu gigantismo e ineficiência deveriam ser subdivididas em diferentes circunscrições municipais, à semelhança do que se verifica noutras grandes cidades espalhadas pelo mundo.
Efectuar uma reorganização administrativa do País, com especial incidência nas áreas metropolitanas, de modo a obterem-se circunscrições municipais com dimensões populacionais mais adequadas, deverá ser um objectivo a prosseguir, de forma gradual, no médio-longo prazo.
A aproximação das autarquias aos seus munícipes implica ainda a existência de uma maior correlação entre as receitas e as despesas municipais, o que pressupõe o acréscimo percentual das receitas cobradas localmente, em detrimento das transferências vindas do poder central .
Neste contexto, impõe-se fazer uma reforma da fiscalidade autárquica no sentido de contemplar formas de tributação que aumentem a quota-parte dos impostos cobrados localmente.
Uma derrama aplicável aos rendimentos das pessoas singulares cobrados na área municipal poderia proporcionar o necessário reforço das receitas locais e uma maior correlação entre as receitas e as despesas camarárias, pelo que os autarcas seriam mais fácilmente responsabilizados pela sua gestão.
Convirá referir que a carga fiscal dos contribuintes deverá permanecer inalterada, o que implica a diminuição do imposto aplicado pelo Estado, por forma a compensar o valor da derrama de afectação municipal.
Deste modo, os munícipes, que suportam localmente com os seus impostos uma parte acrescida das despesas, terão uma maior apetência para analisar como os seus dinheiros foram gastos. Estarão, portanto, mais aptos para sancionarem negativamente com o seu voto a gestão camarária, quando sejam detectadas ineficiências ou desvios da política municipal.
Teria, também, todo o interesse, numa nova concepção de gestão municipal, que as grandes prioridades estratégicas da política autárquica fossem referendadas localmente. A adopção de referendos sistemáticos sobre as principais opções das autarquias permititia aos autarcas desenvolver uma gestão mais adaptada às expectativas das respectivas comunidades.
A concretização destas medidas, ao proporcionar uma maior eficiência e transparência da gestão municipal, possibilitaria aos cidadãos escolher a autarquia mais capaz de satisfazer as suas necessidades e ambições. Estariam, deste modo, criadas as condições para o desenvolvimento de uma saudável concorrência entre as diferentes autarquias, com o correspondente acréscimo de eficiência que daí necessáriamente resultaria.

1 Comments:

At 3:31 da tarde, Blogger Teófilo M. said...

Fico à espera dos nomes das grandes cidades do mundo que sejam apenas associações de municípios!

Quanto a S. Francisco, nos Estados Unidos, o senhor falou em área metropolitana, o que também existe por cá, só que não funcionam, por falta de interesse político.

Depois faltou apenas dizer que seriam os municípios a pagar os hospitais, as escolas, a justiça, a polícia, os bombeiros, os transportes públicos urbanos e suburbanos, a reparação/construcção das estradas dentro dos seus limites, a limpeza e protecção das linhas de água e espaços florestais, a construcção de barragens, portos, aeródromos e outros equipamentos, excepto as que se revestissem de interesse nacional que careceriam sempre de aprovação do governo central.

Não sei até que ponto os nossos autarquas que geralmente estão hipotecados ao betão e seus proprietários, cujos conhecimentos e capacidades não vão muito além da construcção de rotundas, prédios para habitação, ou construcção de poli-desportivos e apoio ao grupo de futebol local, salvo raras e honrosas excepções iriam tornar a curto prazo este País melhor.

Pelo que vejo, quando percorro este País de licenciamentos e projectos sem pés nem cabeça, já é forte dose.

Quando se diz que os políticos são incompetentes, não estarão a falar nos autarcas?

Que caminhemos no sentido de criar escolas de administração pública e a partir daí, com cuidado avancemos no sentido da descentralização, de acordo, agora fazê-lo sem cuidar em criar uma base sólida administrativa será o mesmo que nos atirarmos de cabeça por cima de um muro, julgando apenas que do outro lado estará água.

 

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