sábado, julho 30, 2005

Linha de rumo

Tradição e progresso eram para apóstolos do novo ideal expressões contraditórias, de impossível conciliação e, por isso, entendiam que era necessário destruir o majestoso edificio do passado para que, depois, sobre as suas ruínas, se erguesse o templo da felicidade futura, em cuja cúpula em vez do símbolo da autoridade - deveria brilhar a figura redentora da liberdade!
Deste modo, o edifício do passado sofreu os mais rude golpes; as suas paredes musgosas foram rijamente sacudidas, sem respeito até pelas grandes figuras históricas que as adornavam. Os próprios alicerces em que assentava - os conquistadores e defensores da independência da pátria - sofreram, por vezes, as arremetidas daqueles que viam no passado um estorvo à desenvolução social, uma afronta à hodierna liberdade!
Abriram-se profundas brechas no edifício, mas os novos arquitectos não conseguiram erguer um monumento novo, que, vantajosamente, substituisse o velho palácio.
Desta maneira, os destuidores da tradição vieram apenas confirmar o que a experiência há já muito demonstrara: - é mais fácil destruir do que construir. Tendo-se reconhecido que a destruição do passado não traria, como consequência, a felicidade dos povos, principiou-se a olhar, novamente, para trás e a reconhecer a necessidade de ir buscar à tradição as regras eternas da vida do homem em sociedade.
Os factos destruiram a aparente contradição que alguns viam entre tradição e progresso e vieram mostrar que estes dois termos são elementos harmónicos e essenciais da civilização.
A tradição fornece a base sólida das nossas instituições e o progresso vai adaptando essas instituições às necessidades sociais da hora que passa.
Segundo a velha definição de Aristóteles, o homem é um animal essencialmente social. Está preso aos antepassados pela sua origem, aos contemporâneos pelas suas relações, aos vindouros pelas consequências da sua própria actividade.

FERREIRA DEUSDADO
(in "Regionalismo e Patriotismo", 1934)