sexta-feira, dezembro 24, 2004

Natal, hoje

Do ventre de amargura e solidão
Nasce, esta noite, uma criança.
Chama-lhe esperança
O coração.

Quem restará para adorá-la de joelhos?
Emigram os pastores que sabem ler no céu.
Coroados no exílio, onde vão os três velhos?
Entregar oiro e o mais ao banqueiro judeu.

A estrela anunciadora
Lança, em vão, o seu místico sinal.
Confundem-na, talvez, no progresso da hora,
Com um satélite artificial.

Puro coral dos anjos, destruído
Pela bárbara estridência da boîte,
Não chega a nenhum ouvido
Como um hino de amor e um toque a rebate.

E o desejo mais alto - Paz na terra!-
Tomba como uma flor emurchecida
Na eterna guerra
Em que se esvai a vida.

Do ventre de amargura e solidão
Nasce, esta noite, uma criança.
O coração chama-lhe esperança.
Mas haverá quem tenha coração?

António Manuel Couto Viana