sexta-feira, julho 30, 2004

O tempo que passa

Tempus fugit... A presença de aniversários angustia-me. Sinto a radical impotência da natureza criada perante o tempo. O ser e o tempo, o ser no tempo...
O passado, que se escapa, já não é, o futuro, ainda por vir, também não é, o presente, pois que a cada momento em que o tentamos apreender já ele passou, também não é...
A perplexidade agostiniana ficou-me das "Confissões", oferta generosa que um amigo já passado fez à minha adolescência curiosa. E para reforçar a oferta somou-lhe um dia certa resposta que ainda hoje ecoa no meus ouvidos nestas ocasiões. Foi de uma vez em que nos encontrámos casualmente, e ele inquiriu prazenteiro o que andava eu a fazer. Encolhi os ombros, a sacudir o tédio, e respondi qualquer coisa sobre matar o tempo. O meu amigo sobressaltou-se e retorquiu de imediato em tom alarmado: - "Oh rapaz, não acredites nisso!... Ele é que nos há-de matar a nós!"
O dito causou-me, julgo,um sorriso amarelo, e, garanto, um arrepio na espinha. O tempo é que nos há-de matar a todos... E muitas vezes vai fazendo o trabalho devagarinho, com paciência e requinte. E nós lá vamos morrendo em silêncio, cada dia um bocadinho, sempre por dentro, onde ninguém vê. Chega um dia e descobre-se que de nós já nada resta, com surpresa dos que olhavam e viam só a carapaça ambulante que ia marcando presença entre os vivos.
E nem sei o que fica. Muitas vezes, penso eu, não fica nada. Outras talvez fique, mas isso é consolo para os que ficam, não para quem parte.
Neste ponto caminha-se para T. S. Eliot: - "O tempo presente e o tempo passado/ são ambos presentes talvez no tempo futuro/ e o tempo futuro contido no tempo passado."
Pois. Será assim. Mas eu só sinto que o tempo me foge.