quarta-feira, janeiro 21, 2004

A QUESTÃO IBÉRICA

Como em toda a hora de crise nacional, o perigo ibérico está diante dos nossos olhos, indicando o futuro mais certo da Pátria, se a Pátria se não reabilitar lá fora, quanto antes, pelo regresso à Ordem e pelo respeito a si mesma. Só vivem os povos que sabem viver. E saber viver não é arrastar uma existência subalterna de país tolerado, sem mais direito a dirigir-se e a ter-se em conta de autónomo que a condescendência um tanto duvidosa dos vizinhos. É essa hoje, infelizmente, a nossa desgraçada situação. Levamos a carreira doida do abismo numa farândola de insensatos que se afundam, cantando e rindo, tal como os bailarins macabros da lenda. Ninguém se crispa num gesto que ao menos nos salve a dignidade! Tomou-nos a moleza do invertebrado. E como invertebrados sofremos sem reacção os vexames dum destino que é já de mais para a nossa honra de homens de bem, quanto mais de cidadãos livres duma terra livre! Não temos ainda para cá das fronteiras o inimigo tradicional. E se ele vier, não será a sua aspiração de séculos que o há-de erguer em som de guerra contra nós. Justiça ao cavalheirismo de Castela, nós é que a chamaremos às armas, - hão-de ser os nossos desvarios que, esgotando-lhe a paciência, acabarão por lhe escancarar as portas da casa. A solução intervencionista é lógica, é natural, como as coisas que o são, quando um importuno nos incomoda e nos coloca em risco de quebra o nosso próprio sossego, a nossa própria disciplina. Quem perdeu o jeito de ser prudente e não faz mais nada senão desgovernar-se, abre-se-lhe uma falência ou instaura-se-lhe uma curadoria. Não é outro, meus Senhores, o nosso tristíssimo caso!

ANTÓNI0 SARDINHA