quarta-feira, janeiro 28, 2004

Bispo-Conde, porquê?

Uma vez que a plateia começa a refilar, vamos lá a esclarecer essa designação de Bispo-Conde.
Pois efectivamente, como informaram de pronto os papa-concursos do costume, a razão dessa denominação prende-se com o facto de o Bispo de Coimbra ser por esse cargo também Conde de Arganil.
Aconteceu que no ano de 1471 o Bispo de Coimbra de então acompanhou o Rei D. Afonso V na sua expedição ao Norte de África, e ao que parece teve actuação meritória na conquista de Arzila e Tânger. Em reconhecimento o Rei concedeu-lhe a 25 de Setembro de 1472 o título de Conde de Arganil, para ele e seus sucessores. Enquanto o mundo for mundo...
Mas, direis vós, quem era esse Bispo de Coimbra que mereceu tal distinção? Respondo que era o ilustre eborense D. João Galvão, e foi um dos mais eminentes homens públicos do seu tempo.
Pertencia a uma importante família desta cidade de Évora, da qual saíram outros notáveis da nossa história local e nacional, nesses tempos recuados dos séculos XV e XVI.
Lembro Duarte Galvão, cronista-mor do reino, e embaixador de D. Manuel em Roma, Paris, Viena e Abissínia; os filhos deste, Jorge, Rodrigo, Manuel e Simão, mortos no combate de Achem, no Mar Vermelho; o quinto filho, António Galvão, lendário governador das Molucas, autor do “Tratado dos diversos caminhos da pimenta e especiarias vindos da Índia” e da “História das Molucas”; as três irmãs Galvoas, fundadoras do Convento do Paraíso, no local onde se encontram as ruas de Machede e de Mendo Estevens; Frei Inácio Galvão, religioso dominicano...
O nosso João Galvão era filho de Rui Galvão, escrivão da Fazenda e escriturário de D. Afonso V. Moço de corte, cedo ingressou na vida política, chegando a ocupar o cargo de escrivão da Puridade do mesmo Rei D. Afonso V.
Mesmo ministro e filho de ministro, decidiu-se porém a ingressar na vida religiosa. Entrou para o Convento de Santa Cruz, de Coimbra, em 1448. Não perdeu todavia as ligações políticas, já que três anos depois, apesar de frade agostinho, foi um dos fidalgos que acompanhou a irmã do Rei até à Alemanha para concretizar o negociado casamento desta com o Imperador Frederico III, coisa da maior relevância diplomática. Sobre essa viagem escreveu a “Jornada da Imperatriz D. Leonor”. Era aliás considerado pelos seus contemporâneos homem culto e talentoso, dedicado à letras.
No decurso dessa excursão, que durou muitos meses, fez amizade em Siena com o Bispo desta cidade, futuro Papa Pio II, o que viria ser decisivo no seu futuro.
Regressado a Portugal, foi em 1459 eleito Prior de Santa Cruz, cargo que durante séculos foi uma das mais cobiçadas dignidades eclesiásticas do Reino. Logo a seguir, em 1460, foi nomeado Bispo de Ceuta e pouco tempo depois Bispo de Coimbra, cargo que ocupou entre 1460 e 1481. Além dessa distinção, foi ainda nomeado pelo Papa Pio II “legado a latere” em Portugal, em 1462, pelo que entre esta data e 1464 governou a Igreja em Portugal em nome do Pontífice Romano.
Sendo Bispo de Coimbra, foi escolhido para Arcebispo de Braga, em 1480, por falecimento do Primaz. Foi o seu último cargo, já que morreu a 5 de Agosto de 1485, em Coimbra.
E chega, que com tanta erudição até eu estou cansado. Os óscares vão directamente para as prateleiras do “Nova Frente” e do “Último Reduto”, se ainda tiverem espaço.

1 Comments:

At 12:47 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Não faleceu em Lisboa e foi sepultado em Xabregas?

 

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