terça-feira, setembro 16, 2003

Sobre pedofilia

Nunca se tinha falado tanto sobre pedofilia.
E, como notam mesmo os menos atentos, tem sido visível o embaraço de muita esquerda quanto ao tema. E é natural, digo eu, lembrado do que foi durante tantos anos a teorização da “libertação sexual”, desde o famigerado Wilhelm Reich ao idolatrado Sartre. São muitos anos de luta contra a “repressão sexual” e a “moral burguesa”.
Para esse peditório quero eu aqui deixar um pequeno contributo.
No princípio de 2001, em Berlim, durante o julgamento de Hans-Joachim Klein (Klein foi sentenciado a 9 anos de prisão por estar envolvido em ataques terroristas, nomeadamente a tomada de reféns na sede da OPEP em Viena, em 1975, onde morreram três pessoas) vieram a lume factos sórdidos sobre alguma élite política desta nossa União Europeia.
Os factos mais badalados trazidos então à discussão foram sobre Daniel Cohn-Bendit, deputado no Parlamento Europeu, e coqueluche da extrema esquerda desde há trinta e cinco anos. Daniel, tal como o ministro alemão Joschka Fischer, foram testemunhas no julgamento deste velho companheiro.

A relevância do caso está em que Daniel Cohn-Bendit, aliás Dany Le Rouge, é um símbolo do Maio de 68. E foi também, na década de 70, um defensor público da pedofilia.
No julgamento de Klein, acima referido, e para ajuda à defesa do arguido, militante de extrema-esquerda, estiveram em foco algumas passagens de um livro de memórias de Cohn-Bendit, "Le Grand Bazaar", publicado em França em 1975 (que curiosamente não encontro agora, passado o escândalo, entre a bibliografia do autor mencionada nos sítios que lhe são afectos, nos quais se encontram geralmente referidos apenas “Nous l’avons aimée la révolution”, “Une envie de politique” e “Xénophobies”).
Este livro, além do mais, descrevia as experiências desse "líder radical", com crianças, em Frankfurt, onde vivia depois de ter sido expulso de França.

No seu livro de memórias Dany Le Rouge descreve de uma forma perturbadora e em pormenor as suas relações com algumas das crianças que tinha sob sua responsabilidade. Para ilustração, refere experiências que teve com uma menina de 5 anos, que estava ao seu cuidado, assim como relatos chocantes sobre experiências sexuais com crianças do jardim-escola alemão, onde trabalhava.

No livro podem ler-se confissões deste teor: "Aconteceu várias vezes certas crianças me abrirem a braguilha e começarem a tocar-me. Eu reagia de diferentes maneiras, conforme as circunstâncias, mas o desejo delas punha-me diante de um problema. Eu perguntava: 'mas por que vocês não brincam juntos? Por que me escolheram a mim, e não a uma outra criança? Mas elas insistiam, e eu, apesar de tudo, acariciava-as.”
O livro foi bastante criticado quando foi publicado, nesse longínquo ano de 1975. Mas ainda assim dois anos depois, em 1977, algumas das mais celebradas figuras da intelectualidade “gauchiste” parisiense, incluindo Jean-Paul Sartre, Simone de Beauvoir, Michel Foucault, Jacques Derrida, Philipe Sollers, Jack Lang e Bernard Kouchner (estes dois foram anos mais tarde ministros socialistas da educação e da saúde), assinaram uma petição colectiva onde se apelava à legalização das relações com menores (pedofilia, digo eu), a pretexto dos processos contra três homens condenados por atentado ao pudor nas pessoas de menores com 12 e 13 anos de idade – isto, claro, em nome da liberdade.
Na mesma época outro intelectual conhecido, Gabriel Matzneff, colaborava regularmente no “Le Monde” e era habitual convidado das televisões, onde defendia as suas ideias sobre … "une pédophilie active". Sem que suscitasse reacções de maior, diga-se.
A polémica sobre Cohn Bendit, deputado europeu eleito em França pelos Verdes (o homem tem dupla nacionalidade franco-alemã) atingiu o rubro, primeiro na Alemanha e depois em França, nessa época de Janeiro-Fevereiro de 2001, quando surgiram estas mesmas acusações lançadas publicamente por Bettina Röhl, que tem a autoridade e o conhecimento que resultam de ser filha da famosa terrorista Ulrike Meinhof – e resolveu disparar contra Cohn Bendit e o íntimo amigo deste Joschka Fischer, também antigo militante de extrema esquerda reconvertido em dirigente Verde (e actual Ministro dos Estrangeiros).
Interpelado em Fevereiro de 2001 a este respeito, Daniel Cohn Bendit desmentiu ter praticado qualquer acto pedófilo e explicou que os seus escritos “reflétaient l'esprit de l'époque” e que se tratava de mera "provocation contre le bourgeois”.
O deputado e Presidente dos Verdes, e candidato à Presidência da República, Noel Mamére, veio em socorro de Dany afirmando que a publicação destes extractos do livro tantos anos depois não passava de “trash journalisme”.
O institucional porta-voz do esquerdismo de bom tom, “Libération”, sentiu-se obrigado a vir a terreiro, pela pena do seu fundador e director, Serge July, para lastimar essas posições que, diz ele, “malheuresement” serviram para legitimar “des pratiques parfois criminelles" sobre crianças.
Resta acrescentar que Cohn-Bendit esteve sob investigação na Alemanha durante vários anos, mas só poderia ser processado se o Parlamento Europeu suspendesse a sua imunidade – questão que nunca se pôs.