segunda-feira, setembro 22, 2003

O primeiro Manifesto Futurista (a propósito de Almada)

1. Queremos cantar o amor do perigo, o hábito da energia e da temeridade.

2. A coragem, a audácia, a rebelião, serão elementos essenciais da nossa poesia.

3. Até hoje, a literatura exaltou a imobilidade pensativa, o êxtase e o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insónia febril, o passo de corrida, o salto mortal, a bofetada e o sopapo.

4. Declaramos que a magnificência do mundo se enriqueceu de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um carro de corrida com a carroçaria enfeitada por grandes tubos de escape como serpentes de respiração explosiva… um carro tonitruante que parece correr entre a metralha é mais belo do que a Vitória de Samotrácia.

5. Queremos cantar o homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada, por sua vez, em corrida no circuito da sua órbita.

6. O poeta terá de se prodigar, com ardor, refulgência e prodigalidade, para aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.

7. Não há beleza senão na luta. Nenhuma obra que não tenha um carácter agressivo pode ser considerada obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças ignotas, para reduzi-las a prostrar-se perante o homem.

8. Estamos no promontório extremo dos séculos!… Porque deveremos olhar para detrás das costas se queremos arrombar as misteriosas portas do impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Nós vivemos já no absoluto, pois já criámos a eterna velocidade.

9. Nós queremos glorificar a guerra, o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas ideias por que se morre e o desprezo da mulher.

10. Queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academias de todo o tipo e combater o moralismo, o feminismo e todas as vilezas oportunistas ou utilitárias.

11. Cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela revolta; cantaremos o vibrante fervor nocturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas luas eléctricas; as gulosas estações de caminho-de-ferro engolindo serpentes fumegantes; as fábricas suspensas das nuvens pelas fitas do seu fumo; as pontes que saltam como atletas por sobre a diabólica cutelaria dos rios ensolarados; os aventureiros navios a vapor que farejam o horizonte; as locomotivas de vasto peito, galgando os carris como grandes cavalos de ferro curvados por longos tubos e o deslizante voo dos aviões cujos motores drapejam ao vento como o aplauso de uma multidão entusiástica.


Filippo Tomaso Marinetti