quinta-feira, agosto 28, 2003

Recados para Évora

Eu bem queria participar nesses simpáticos debates que percorrem a blogosfera eborense e que têm por tema, louvável, a valorização da urbe.
Mas não tenho coragem. Circundo as muralhas e dou de caras com as tais manilhas gigantes acumuladas junto às Portas de Alconchel; continuo em direcção à Porta da Lagoa e dou por mim a passar o indescritível troço-de-muralha-caiada-com-janelas que ficou em amostra na própria Porta da Lagoa, para contrastar com a massa pétrea do Calvário; um pouco à frente passo sob os arcos do aqueduto deparando à esquerda com um denso matagal e à direita com os restos degradados das construções encostadas à muralha, que devia estar limpa em execução de um programa com cinquenta anos; prossigo, e após ultrapassar a zona de obras da Porta de Avis e nova rotunda da Ladeira do Seminário acabo por chegar à espantosa calote esférica vermelha, com pedras de granito à volta, que ficou a marcar a rotunda da Porta de Machede; seguindo viagem, para a direita, encontra-se logo o enorme espaço que foi o antigo matadouro, e onde a querida Câmara conserva o esqueleto arruinado das antigas construções, e um centro de escultura em pedra que dia e noite vomita poeira e barulho para os moradores da zona da Avenida S. João de Deus...
Estaciono, e vou até à zona mais nobre da cidade, pagar a conta à EDP. A Praça de Sertório lá está esventrada, em obra de onde fatalmente surgirá nova maravilha requalificadora; mas antes levanto a cabeça para a Igreja de Santiago, e logo desvio o olhar tal o aspecto horrendo e tenebroso do templo, que não vê cal há séculos.
Os nossos chafarizes e fontes, do Largo de Machede, do Largo de São Mamede, da Porta da Lagoa, da Rua Serpa Pinto, e sei lá que mais, em vez de se apresentarem como oásis refrescantes e límpidos exibem-se ressequidos como permanentes vazadouros de porcaria.....
Não tenho coragem. Vem- me à memória, em ameaçador galope, a história trágica das sucessivas melhorias que nestas últimas duas décadas foram destruindo o espaço do que foi o Jardim das Canas, no Largo de São Domingos (os mais novos não imaginam já que ali era um jardim). E a perspectiva de mais melhoramentos afigura-se aterradora.
E não tenho coragem. Chega um conhecido e conta que a cidade está em sério risco de a breve prazo ter um estádio municipal, ao Bairro de Almeirim, como já foi exibida a maqueta, e um outro do Lusitano, à Estrada das Alcáçovas... e penso de imediato o que irá fazer o Juventude. Eis o milagre da multiplicação dos estádios, que depois de ter afectado o país chegou enfim à nobre cidade de Sertório!
Contemplo, esplendorosa, a "cultura de excelência" do impagável Professor Zorrinho...
E falta-me a coragem. Não consigo falar de floreiras, tenham paciência.